quarta-feira, 3 de outubro de 2007

SER...



“Eu deixarei que morra em mim o desejo
de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a
tristeza de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer
coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o
teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser
tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim como a fé
nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de
orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como
nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a
tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu
desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui
eu, porque eu fui o grande íntimo da noite.
Porque eu encostei minha face na face
da noite e ouvi a tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos
da névoa suspensos no espaço.
E eu trouxe até mim a misteriosa essência
do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos
pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém porque
poderei partir.
E todas as lamentações do mar, do vento,
do céu, das aves, das estrelas.
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente,
a tua voz serenizada”

Vinicius de Moraes

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